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Justiça às escondidas? Acareação de Braga Netto ocorre em sigilo parcial e levanta suspeitas de tratamento especial

“Soa mais como um privilégio do que uma precaução”, afirma advogado sobre sigilo do ex-ministro em audiência com Mauro Cid

DA REDAÇÃO –  SÃO PAULO

O caso envolvendo o ex-ministro Braga Netto, preso e atualmente sob investigação, ganhou um novo capítulo nesta terça-feira (24), com a realização da acareação entre ele e o tenente-coronel Mauro Cid. O encontro, no entanto, foi marcado por uma medida que reacende discussões sobre transparência e privilégios: a solicitação da defesa de Braga Netto para manter em sigilo o local onde ele ficaria hospedado antes da audiência. Embora o sigilo não tenha sido absoluto, a restrição foi suficiente para impedir o registro de imagens da acareação.

Em um momento em que a transparência e a confiança pública nas instituições judiciais se tornam cada vez mais decisivas, o pedido levanta questionamentos sobre os limites da proteção e o impacto político e social de uma medida que pode ser facilmente interpretada como uma tentativa de garantir privilégios.

Do ponto de vista jurídico, há quem questione se esse pedido fere o princípio da publicidade dos atos judiciais. Para o advogado eleitoral Wallyson Soares, o argumento da defesa de Braga Netto não se sustenta, uma vez que o processo é de grande interesse público:

“Esse é um caso de grande repercussão e Braga Netto é figura central nesse processo. A publicidade do local onde Braga Netto ficou hospedado em Brasília não afeta a intimidade nem a sua privacidade, como alegado. Até porque os fatos dos autos são de repercussão pública”, afirma o advogado.

Desde o início das investigações, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, tem se destacado pela postura de transparência. Seus passos à frente do caso têm sido seguidos de perto, não apenas pela mídia, mas também pela sociedade, que observa atentamente os movimentos do Judiciário. A credibilidade das decisões tomadas é fundamental para evitar que o processo judicial se transforme em um campo de especulações e teorias conspiratórias. Quando uma figura de peso como Braga Netto, que exerceu um papel decisivo no governo Bolsonaro, está envolvida em um caso de grande repercussão, qualquer sinal de tratamento diferenciado pode ser visto como uma brecha para alimentar desconfianças.

Ainda que o sigilo tenha se limitado ao local de hospedagem do ex-ministro, a decisão levanta dúvidas sobre possíveis precedentes. Wallyson lembra que o procedimento da acareação não foi realizado de forma pública no STF:

“Apenas o local em que ele ficou hospedado permaneceu sob sigilo. A audiência de acareação foi realizada no STF, no entanto, não foi possível gravar e nada foi transmitido ao vivo, ficando registrado apenas em ata”, explicou.

O pedido de sigilo para o local da acareação, por mais que tenha sido justificado pela defesa como uma medida de segurança, carrega consigo um fardo político significativo. Em uma era marcada pela polarização e pela desconfiança nas instituições, especialmente aquelas relacionadas à Justiça, qualquer decisão que pareça fugir ao padrão de transparência é um convite ao questionamento. Seria esse um gesto legítimo de precaução ou um movimento para evitar o escrutínio público? Para uma parte da população, o pedido pode soar como uma tentativa de proteger um dos mais altos escalões da política brasileira; ao passo que outra parcela poderia interpretá-lo como um reflexo de um sistema judicial ainda permeado por privilégios, que preservaria figuras políticas poderosas.

Nesse sentido, Wallyson Soares também se posiciona. Para ele, não há qualquer risco real: “No caso de Braga Netto, não há risco à sua integridade física. Ele está sob a custódia do Estado, através do sistema prisional onde está preso. Então, soa mais como um privilégio do que uma precaução”, avalia.

O Brasil vive um contexto em que a seletividade no trato com figuras políticas é um dos temas mais sensíveis da agenda pública. Em um momento histórico no qual os cidadãos exigem mais clareza e imparcialidade do sistema judicial, decisões como esta podem ser vistas sob a ótica da vantagem política. O ex-ministro Braga Netto é, sem dúvida, um personagem central da política recente e, como tal, sua posição, ações e a forma como é tratado pelo Judiciário estão sob vigilância constante.

Além disso, ao optar pelo sigilo, mesmo que parcial, o Judiciário corre o risco de alimentar especulações que podem prejudicar a imagem do processo e da própria investigação. A transparência, nesse sentido, não é apenas uma questão de eficiência processual, mas de fortalecimento da confiança pública. O próprio STF, ao buscar transparência em outras decisões e investigações, tem se posicionado contra a ideia de que certos indivíduos podem ser tratados de forma distinta. Resta agora aguardar os próximos passos do STF quanto às informações referentes à acareação.

 

Foto destaque – Rosinei Coutinho/STF/Divulgação

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